Com apps como o WhatsApp, enviar fotos de si mesmo nu ganha nome e fica popular, mas gera medo de vazamentos
Fotos de nudez do ator Stênio Garcia, 83, e de sua mulher vazaram na semana passada e geraram rebuliço nas redes sociais – só no dia do vazamento, houve mais de 71 mil menções relacionadas a "nudes" no Twitter, segundo medição da empresa de monitoramento Scup. O número é três vezes maior que a média do mês.
Fotografar-se nu não é, obviamente, um comportamento restrito ao ator. E não só fotografar, mas também "mandar nudes" – expressão que ficou popular na Internet para o ato de enviar fotos sensuais principalmente por apps de mensagens.
Segundo pesquisa on-line do Instituto Qualibest com 579 pessoas feita na semana passada, 12% dos entrevistados já compartilharam fotos ou vídeos da própria nudez na Internet. O levantamento reflete a população internauta brasileira de 16 a 30 anos.
O WhatsApp é o principal aplicativo para esse tipo de troca de mensagens, escolhido por 87% dos usuários. O Snapchat, em que as fotos desaparecem após serem vistas, aparece na segunda posição, com 25%.
A universitária Tatiana (nome fictício), 20, de São Paulo, e o namorado têm até dia para enviar nudes: quartas-feiras. O casal mora em cidades diferentes e escolheu esse dia para matar a saudade.
"O nude é uma forma de se relacionar a distância. Nos sentimos mais próximos e até ganhamos confiança, pois estamos mandando algo bastante íntimo", afirma.
Na opinião da psicanalista Marielle Kellermann, que pesquisa a relação entre psicanálise e tecnologia, a instantaneidade dos aplicativos de mensagem exacerba o exibicionismo. "Eles despertam e potencializam a vontade intrínseca das pessoas de valorizar o corpo", diz.
O estudante João Godoy, 19, criou um um grupo no WhatsApp com mais nove amigos e amigas só para mandar imagens sensuais.
A brincadeira, que durou quatro dias, era temática – os assuntos foram de "cowboy" a "dia do estudo". "Meu amigo tirou uma foto deitado em cima da cama, do lado de vários livros." No final, eles escolhiam a melhor imagem.
AS ORIGENS
"Manda nudes" virou uma expressão popular depois que o publicitário Vinícius Curi, 27, criou uma página no Tumblr com esse nome. Ali, ele alterava imagens conhecidas, como o logo da "Sessão da Tarde", para "Manda Nude". As ilustrações viralizaram na rede.
"No começo fiquei assustado, porque diziam que o meme incentivava as pessoas a mandarem fotos peladas. Depois percebi que muita gente acabou discutindo os perigos", diz Curi.
Entre os riscos está o vazamento das imagens, que já provocaram casos de suicídio no Brasil. A ONG SaferNet, que oferece auxílio psicológico a vítimas do crime, atendeu a 224 casos desse tipo no ano passado, um crescimento de 120% em relação a 2013.
Isabela (nome fictício), 15, é uma das vítimas da exposição indesejada. Colegas da escola da menina criaram um grupo anônimo no WhatsApp com o objetivo de divulgar fotos íntimas suas para todo o ensino médio.
"Eu fiquei muito mal, me sentindo muito culpada", conta a garota, cujo maior medo é que as imagens cheguem até seus pais. "Eu não tinha conhecimento de que isso poderia me prejudicar para o resto da vida."
Das denúncias recebidas pela SaferNet, 81% são de mulheres. E a maior parte dos outros 19% são de homens que marcaram encontros com outros homens e passaram a ser ameaçados de ter sua orientação sexual revelada.
"Trata-se de uma questão de gênero. Geralmente os homens heterossexuais não procuram ajuda e não sofrem grande consequência. As mulheres sentem um impacto social grande", afirma a coordenadora psicossocial da SaferNet, Juliana Cunha.
Godoy, o estudante que montou o grupo de WhatsApp para trocar imagens íntimas, diz que não tem medo de suas fotos vazarem. O motivo: ele ser homem.
"Se alguém recebe uma foto de homem, fala só: 'Nossa, que merda'. Se é de uma menina, a foto se espalha."
Por: MATEUS LUIZ DE SOUZA | JÚLIA BARBON
DE SÃO PAULO
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