segunda-feira, 23 de julho de 2018

Falta de informações judiciais prejudica combate ao bullying no país

Falta de informações judiciais prejudica combate ao bullying no país
Por Dra. Ana Paula Siqueira para a revista Direcional Escolas.




O crescimento das disputas judiciais de pais contra pais ou pais contra escolas, provedores de acesso e redes sociais é o cenário encontrado pelo SLM Advogados em levantamento anual sobre bullying e cyberbullying no âmbito escolar. Realizado desde 2013 no Tribunal de Justiça de São Paulo, os números mais recentes obtidos pelo escritório indicam, ao menos, 4 mil processos em tramitação somente no Fórum Central João Mendes Júnior, o maior do judiciário estadual. Estima-se que mais de 8,4 mil situações ocorram nas escolas públicas do estado a cada ano. E cerca de 900 desses casos estão com a banca, que viu a procura por assessoria jurídica aumentar 50%, apenas em 2016, com 302 novas situações se comparado ao ano anterior. A alta dos casos demonstra que o uso de smartphones, tablets e redes sociais faz o problema do bullying sair do pátio da escola e chegar às casas dos alunos, na intimidade do lar.

Os dados foram repassados por Ana Paula Siqueira, sócia fundadora do SLM Advogados e integrante da Comissão de Direito Digital da OAB-SP, em palestra para mais de cem pais, educadores, advogados e jornalistas na noite de sexta-feira, 7 de abril, na capital paulista. A data lembra o Dia Nacional de Combate ao Bullying e marcou o lançamento do livro Comentários à Lei do Bullying Lei n. 13.185/15 (leia mais sobre a obra no link e abaixo). A advogada diz que, apesar da dificuldade de acesso e complexidade de análise processual nos fóruns da Justiça, foi possível aprender o comportamento das partes em conflito e compreender a tendência dos julgados, em decisões que já alcançam instâncias superiores. E dados estatísticos são necessários para que as escolas possam trabalhar com a realidade de uma forma muito mais concreta.

Os números poderiam ser ainda mais precisos se os tribunais produzissem relatórios sobre ações judiciais de bullying e cyberbullying, o que não impediria o cumprimento do segredo de justiça concedido às situações com crianças e adolescentes. A advogada lamenta a falta de iniciativas e condições do sistema de justiça para coletar informações de casos judicializados e que a Lei do Bullying, em vigor desde fevereiro do ano passado, não disponha das funções do Judiciário e do Ministério Público neste tema. A lei apenas obriga estados e municípios a produzir e publicar relatórios bimestrais das ocorrências para fins de planejamento das ações de prevenção e enfrentamento ao bullying. Circunstância diferente de outras leis, como a Maria da Penha, que determina a inclusão das estatísticas sobre a violência doméstica e familiar contra a mulher nas bases de dados dos órgãos oficiais do sistema de justiça e segurança a fim de subsidiar o sistema nacional de dados e informações relativo às mulheres.


Todas as situações do levantamento produzido pelo SLM Advogados envolvem cyberbullying, prática que usa tecnologias de informação e comunicação para dar apoio a comportamentos deliberados, repetidos e hostis praticados por um indivíduo ou grupo com a intenção de prejudicar o outro. E quase a metade registra ações de cyberstalking, que significa o uso de ferramentas tecnológicas com o objetivo de perseguir ou assediar uma pessoa. “Em que pese nos últimos dez anos terem se multiplicado as discussões sobre o bullying nas escolas, o problema cresce. Ainda há um descompasso entre o que se é admitido pelas autoridades de ensino e os casos concretos”, diz Ana Paula Siqueira.

Segundo afirma, a única forma de prevenção ao cyberbullying é mediante a educação de adultos, crianças e adolescentes. Trabalho que demanda conhecer a problemática das relações humanas, identificando-as dentro das instituições e planejando ações de combate efetivas para a transformação da cultura de violência em cultura de resiliência. E o primeiro passo é reconhecer situações de violência física ou psicológica, intencional e repetitiva, cometidos pelos educandos presencialmente ou por meio de smartphones, tablets e redes sociais.


Obrigações legais das escolas e consequências jurídicas

A vigência da Lei do Bullying é um marco social que impactará profundamente nas relações sociais existentes nas instituições de ensino e nos clubes. A partir deste entendimento, a especialista em Direito Digital Ana Paula Siqueira Lazzareschi de Mesquita analisa e explica a Lei 13.185/15 que institui o programa de combate à violência sistemática e repetitiva em todo o país. A intenção de Comentários à Lei do Bullying nº 13.185/2015 é ser apoio à interpretação da lei com análises de cada artigo legal, indicações das leis aplicáveis aos casos de bullying e de julgamentos ocorridos nos tribunais brasileiros. Isto para que administradores e gestores, públicos e privados, possam sair, definitivamente, da zona de conforto e negação sobre os prejuízos causados por esta violência, pelas vias presencial e on-line.

A autora é criadora do programa jurídico-educacional de combate à intimidação sistemática Proteja-se dos prejuízos do cyberbullying. A proposta já é adotada pelas mais importantes escolas particulares de São Paulo e permite o gerenciamento de todo o ambiente de segurança. Os processos de Educação Digital e Compliance Escolar são disponibilizados a pais, alunos e professores para a prevenção, diagnose e combate aos riscos de incidentes digitais, de toda e qualquer natureza. O programa surge em 2014 – antes da publicação da Lei do Bullying, que institui às escolas, clubes e agremiações o dever de implementar ações educacionais, jurídicas e psicológicas em face do problema. Isto num cenário em que 80% das ocorrências na comunidade escolar envolvem preconceito, discriminação estética, difusão de conteúdos íntimos por dispositivos eletrônicos, dentre outras situações que também atingem educadores.

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