Justiça faz corporações da Internet pagarem por lavagem de mãos nos nudes
Por Ana Paula Siqueira Lazzareschi de Mesquita, sócia de SLM Advogados e coordenadora do programa jurídico educacional “Proteja-se contra prejuízos do Cyberbullying”
A situação do uso abusivo e descontrolado de dispositivos móveis demanda que todas as instituições de ensino tenham um programa educacional digital e políticas de compliance fortes. Não podem contar com a boa vontade da rede social. Apenas a força da decisão judicial poderá obrigar as redes sociais a fazer ou deixar de fazer, enquanto menores sofrem as consequências da lavagem de mãos das grandes corporações.
O compartilhamento de nudes por aplicativos móveis como o WhatsApp têm causado dor e transtorno aos envolvidos, especialmente do gênero feminino, sejam adultas, adolescentes e crianças. O Facebook no Brasil responde às notificações sempre com a mesma argumentação: que a transação de aquisição do aplicativo WhatsApp ainda não foi concluída e que o servidor está em outro país; não possui responsabilidade, pois o “Facebook Brasil” seria pessoa jurídica distinta do “Facebook Inc.”; e existe impossibilidade técnica de remoção de conteúdo.
Falácias. A negociação já está sacramentada nas autoridades de valores americanas; o fato da empresa WhatsApp não possuir representação no Brasil não impede o ajuizamento da medida contra o Facebook, pois são claramente um grupo econômico. A jurisprudência demonstra a legitimidade da empresa representada para figurar no polo passivo de ações, pois a Facebook Serviços Online do Brasil Ltda. foi constituída para atuar como representante da empresa norte-americana, possuindo controle para retirada de conteúdos indevidos do sítio de relacionamentos.
Para entender a tentativa de Facebook de não ser o que de fato é importante se conhecer a teoria da aparência ou aparência de direito, definida pelo jurista Álvaro Malheiros como sendo "uma situação de fato que manifesta como verdadeira uma situação jurídica não verdadeira, e que, por causa do erro escusável de quem, de boa-fé, tomou o fenômeno real como manifestação de uma situação jurídica verdadeira, cria um direito subjetivo novo, mesmo à custa da própria realidade" (Aparência de direito. Revista de Direito Civil, Imobiliário, Agrário e Empresarial. São Paulo: RT, n.6, p. 46, 1978).
No caso em apreço, é fato que o Facebook Brasil se apresenta aos consumidores utilizando a mesma logomarca da empresa americana. Além disso, ao digitar na rede mundial o endereço como sendo do Facebook Inc. - www.facebook.com - abre-se, na realidade, a página da Facebook Brasil. Diante dessa moldura fática é de se supor que o consumidor não distingue com clareza as divisas entre a empresa americana e sua correspondente nacional.
Diante dessa clareza já expressa em corte, a jurisprudência estabeleceu as bases dessas disputas. Sentenças têm demonstrado como não sendo razoável impor às pessoas em nosso país demandar contra o Facebook nos Estados Unidos, especialmente se a demora na retirada das informações de cunho sexual é fator preponderante para agravar sofrimento moral das vítimas.
Outro aspecto já mudou. Como o Facebook sempre declara impossibilidade técnica para a remoção de conteúdo, as vítimas pedem e a Justiça determina a quebra de sigilo dos IP dos números de celular que constam nos grupos e perícia técnica judicial para que se obtenha êxito. O WhatsApp registra o número de telefone e o IMEI, que é o número de série do equipamento, por essa razão peritos forenses provam ser possível o rastreamento das mensagens enviadas.
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